13 de abril de 2012

Gosto porque sim. E isso é estúpido.


A ideia de partilha de modos de estar e sentir através de, por exemplo, redes sociais atormenta-me, quanto mais não seja pela perda de identidade individual em detrimento do sentimento de fazer parte de um grupo. É a ideia de gang que se generaliza e a perda de valor individual.
Quando vejo alusões, como frases ou vídeos, a autores que aprecio fico furioso, pois não suporto que haja alguém com uma relação com aquele pedaço de mim. É-me fácil aconselhar alguém a ver, mas não gosto da partilha de emoções específicas em relação a uma cena, ou a uma frase, mas sim da troca de perspectivas. Sinto que a minha individualidade se perde na partilha, e custa-me a aceitar que as pessoas gostem especificamente do mesmo aspecto que eu, quando aquilo faz parte de mim, e não quero pertencer a um grupo de gente que abertamente gosta do mesmo. Não por me achar superior, mas antes por achar que se quebra algo na minha construção cultural.
Mas parece que a Internet, no processo inverso veio criar a ideia da partilha de emoções, e não a partilha de cultura. Ninguém no facebook diz: aconselho vivamente este livro ou filme, toda a gente dá a sua opinião pessoal, quantifica o gosto do mesmo, partilha uma frase que passa, por vezes na parvoíce, como profunda, identifica-se com uma música de um album de uma banda e espera a generalização do seu gosto e que outras pessoas dêem a essa opinião determinada importância. Perde-se portanto na divulgação de cultura e ganha-se na divulgação de opiniões, criando um ciclo que pode vir a generalizar. Como um gang, gera-se um conjunto de pessoas dispostas a defender essa opinião de gosto, contra as pessoas que não concordam, provocando em vez de um saudável debate, um tiroteio irracional de palermices ditas, no fundo um "ou é isto ou és estúpido porque sim e mais nada". A massa crítica individual perde-se pela influência do tal gang, onde se geram estas famigeradas manifestações comuns de gosto. Trata-se assim de uma educação geral do gosto, como se de matemática ou religião se tratasse. E não considero nada disto saudável. A cultura pertence a todos mas tem de ser vivida interiormente  e não em grupo, até porque se tal acontecer não se ganha nada em partilhar a mesma experiência com uma pessoa ou pessoas que já pensam, ou dizem que pensam da mesma maneira, porque à partida o nosso gosto individual estará condicionado pelo gosto do grupo em que nos inserimos, uma noção que abomino.
Numa nota final, também a aparência de cultura é desencadeada a partir deste tipo de interação social, e quase que é impelida para aceitação no tal gang, e o oco cultural ocorre, e o senso crítico perde-se por aí.  O comentário em relação a uma obra cultural, apesar de partir da boca da pessoa, pode ter surgido através do grupo onde essa pessoa se considera incluída, pois considerando o historial de gosto do grupo, a opinião de rebanho é novamente manifestada, sem que forçosamente haja uma interação individual com a obra, mas uma interação indirecta através do rebanho. Assim, já não é raro ouvir alguém falar solenemente de um filme ou livro que talvez nunca lhe tenha passado pelas mãos ou olhos, e formar um juízo inicial apenas porque sabe que existem já opiniões idênticas dentro do grupo da sua largura de banda de gosto. Ou porque leu algo sobre o assunto de um crítico com quem sente afinidade, ou por outra razão qualquer. A troca de impressões é saudável quando não há unanimismos nem fundamentalismos colectivos.
Por isso não me espantou tanto que, numa entrevista, os apresentadores de um novo programa sobre cinema no Hollywood tenham dito, legitimamente: "[...]como não temos tempo para ver os filmes, recorremos aos trailer e a opiniões na net…" mas, que apesar disso "[...] somos nós que escrevemos os textos[...]". Párem com isto, por favor, chega de brincar ao "diz que sabe", tenho ainda a integridade na mais alta conta.

Pode até parecer que me contradigo ao gostar de escrever opiniões num blog, mas apesar de tudo a crítica é individual e da responsabilidade de quem emite a opinião, mas quem dela se apropria e a retém como sua, sem a dissecar a partir do seu ponto de vista é a meu ver, isso sim, ridículo.

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