28 de abril de 2008

E ao 3º dia...

As Portas que Abril abriu

«Era uma vez um país
onde entre o mar e a guerra
vivia o mais infeliz
dos povos à beira-terra.

(...)

Era uma vez um país
de tal maneira explorado
pelos consórcios fabris
pelo mando acumulado
pelas ideias nazis
pelo dinheiro estragado
pelo dobrar da cerviz
pelo trabalho amarrado
que até hoje já se diz
que nos tempo do passado
se chamava esse país

Portugal suicidado.

(...)

Foi então que Abril abriu
as portas da claridade
e a nossa gente invadiu
a sua própria cidade.
Disse a primeira palavra
na madrugada serena
um poeta que cantava
o povo é quem mais ordena.

(...)

Foi esta força viril
de antes de quebrar que torcer
que em vinte e cinco de Abril
fez Portugal renascer.
E em Lisboa capital
dos novos mestres de Aviz
o povo de Portugal
deu o poder a quem quis.»

in SANTOS, Ary dos.- As Portas que Abril Abriu. Lisboa, 1975.

22 de abril de 2008

14 de abril de 2008

Rádio #2

-Até logo.
Acabei de rodar a chave e estou a pôr o cinto.
São 10h45,
enquanto o motor aquece, tenho uns segundos mortos para ligar o rádio
são mais ou menos 10h45, talvez um pouco mais.
estão a falar de cinema na Antena 1, deixo estar
Ok, já são quase 11h e tenho aula às 11h.
Atrasado, "What else is new?", arranco desajeitadamente.
Findo o folheto cinematográfico, o António Cartaxo mete Beatles a propósito do barroco, não percebi porquê, distraído a encontrar estacionamento.
Desligo o carro. Desligo o rádio.

-Porra! Já 'tou atrasado! Mesmo que demore uma hora e um quarto, já lá chego depois das 5h.
Deixo a velha Nacional 1, e entro numa das mais bonitas vias de Portugal. 50 milhas de asfalto envoltas pela natureza pura do interior, entre Condeixa e Tomar. Infelizmente abandono-a 5Km's depois.
Sinto-me sozinho, já tenho o plano de treino na cabeça, e nada mais para pensar.
Ligo a Antena 2, hoje é o Romantismo do sex. XIX que me fará companhia até Alburitel.



-Correu bem. Ok, eles não ligaram nada ao 4v1, mas não correu mal. Aquele Zé,... Sexta-feira vai ser diferente.
Estou cansado agora. Bastante cansado. Pena demorar só 2 temas até casa.
Jazz, o meu Jazz. Relaxante, delicioso, o melhor período do dia ao volante.
Demoro em pôr-me a caminho, fico ali 5, 10 minutos a abrandar o meu ritmo cardíaco, a recuperar a voz, a pensar que jantar me espera em casa.

-Que jogo de bosta!! 'Inda queixavam-se do Chelsea do Mourinho, pfff. Pasmaceira! Imagino o Liverpool-Arsenal, que jogatana não terá sido.
Paz, a estrada só para mim.


Vou imaginando o serão dentro das casas por que passo:
Os mais novos a fazerem os
tpc's de matemática "Pai, ajuda-me aqui!".
As mais novas a plenearem o guarda-roupa para amanha.

As mais velhas a descançarem o intelecto em frente às novelas da TVI.
Os mais velhos, aqueles que já chegaram, a entreterem-se com "A Bola" que não tiveram tempo para ler de manhã.
Na rádio, abrem a antena (a 1) para "O amor é ..." e a-propósito da discrepância entre respostas de inquiridos e inquiridas, Júlio Machado Vaz entretem-me com uma anedota subtil dos seus tempos de recreio do liceu.
-4-2 para os Beatles do Rafa Benitez. Tcchhii!
O noticiário desportivo aumenta a minha frustração de não ter assistido ao jogo do ano.
'Acordo' da estrada com mais «5 minutos de Jazz».
Enquanto os outros vêem televisão, eu oiço a Alma Nostra. Conversa interessantima, pontos de vista mais distanciados daqueles que nos habituámos a ouvir, e também algum ego à mistura. "Não é?", Carlos Magno e Prof. Amaral Dias, "Não é?".
Fico no carro até à meia-noite a ouvir um curiosidade engraçadissima: o primeiro boicote olímpico de que há memória foi praticado pelos chineses.

Vou dormir, afinal de contas, já é quarta-feira!

11 de abril de 2008

Rádio #1


Re-Descobri a rádio.



As 3ª feiras de levantar, aula, almoçar, planear, viajar, treinar, jantar, viajar, ler/ver/ouvir e deitar, obrigaram-me a hipócritizar-me. Passei a deslocar-me (quase) exclusivamente no meu contemporâneo mercebes-benz da mira sobre o capot, contrariando valores ecológicos e de consciência comportamental de sociedade que apregoo.
Este aburguesar da minha rotina aproximou-me da rádio.

A rádio de há 30 ou 40 anos era certamente mais interessante que a actual.
Enquanto que o conceito de tv nacional se confunde com série horizontal de telenovelas, a rádio repete o aforismo da programação em linha recta, desta vez com música.
Paradoxalmente, tal como na televisão, o aumento da oferta de canais/estações não elevou a qualidade, nem tão pouco aumentou o leque de opções. (não , não é um contra-senso).
A maioria das rádios actual poderia facilmente ser substituida por um gerador de playlist's (sim, eu ainda acredito que o não o é já).
Não se distinguem entre si, passam a mesmo música, às mesmas horas, sempre com a lógica de martelar repetidamente os mesmos temas até que "entrem no ouvido".

E aqui se salva o serviço público...
(continua)

5 de abril de 2008

"Concerto para corpo e alma"

Há imenso tempo, anos até, encontrei esta poesia, por acaso na internet e fiquei apaixonada pela sua simplicidade e pelo sentido que fazia na altura na minha vida... Guardei-a, partilhei-a e entretanto perdi-a... Hoje, não sei porquê lembrei-me dela, reli-a e não resisti a postá-la...

"Concerto para corpo e alma"

"Compreendi que a vida não é uma sonata que, para realizar sua beleza, tem que ser tocada até o fim. Dei-me conta, ao contrário, de que a vida é um álbum de minissonatas. Cada momento de beleza vivido e amado, por efêmero que seja, é uma experiência completa que está destinada à eternidade.
Um único momento de beleza e de amor justifica a vida inteira." (Rubem Alves)

3 de abril de 2008

Excertos - Rio das Flores

"(...) Tenho medo de uma coisa que tu não temes: que, depois de conhecer a liberdade, de ter viajado e vivido em países livres, não me volte a habituar a viver de outra maneira. Tenho medo que a liberdade se torne um vício, enquanto que agora é apenas uma saudade."

"(...)Há decisões que se tomam e que se lamentam a vida toda e há decisões que se amarga o resto da vida não ter tomado. E há ainda ocasiões em que uma decisão menor, quase banal, acaba por se transformar, por força do destino, numa decisão imensa, que não se buscava mas que vem ter connosco, mudando para sempre os dias que se imaginava pela frente. Às vezes são até estes golpes do destino que se substituem à nossa vontade paralisada, forçando a ruptura que temíamos, quebrando a segurança morta em que habitávamos e abrindo as portas do desconhecido de que fugíamos".

"(...)Quem nunca sofreu por amor nunca aprenderá a amar. Amar é o terror de perder o outro, é o medo silêncio e do quarto deserto, de tudo o que se pensa sem poder falar, do que se murmura a sós sem ter a quem dizer em voz alta. É preciso sentir esse terror para saber o que é amar. E, quando tudo enfim desaba, quando o outro partiu e deixou atrás de si o silêncio e o quarto deserto, por entre os escombros e a humilhação de uma felicidade desfeita, resta o orgulho de saber que se amou."

In "Rio das Flores" de Miguel Sousa Tavares